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A busca excessiva pela juventude eterna é prejudicial para toda a sociedade

JUL 07, 2022

João Dall'ara - Jornal da USP. Confira matéria original aqui.


Esny Soares indica que a passagem do tempo e o envelhecimento devem ser mais valorizados e que a valorização da juventude é típica da cultura ocidental


O envelhecimento é tratado como um enfeiamento ou ruptura com os padrões de beleza impostos – Foto: Freepik


Uma das características da sociedade contemporânea é a busca intensa pela juventude. O passar da idade se tornou um tabu, de modo que as pessoas desejam parecer cada vez mais jovens para se adequar ao padrão de aparência imposto. O envelhecimento é rejeitado e as mudanças de características físicas são desvalorizadas e omitidas. A alta dos procedimentos e da comercialização de produtos estéticos é um exemplo disso.


Esny Soares, pesquisador do Instituto de Psicologia da USP, analisa os motivos que levam à busca excessiva pela jovialidade: “Historicamente, a ideia de envelhecer sempre foi rechaçada, ficar velho é sinônimo de ficar ultrapassado. A sociedade, de um modo geral, mas especialmente a brasileira, associa o envelhecimento a uma perda, um prejuízo, e nisso está embutido um descrédito do potencial do idoso”.


Em uma sociedade que atrela a beleza à juventude, o envelhecimento é tratado como um enfeiamento ou ruptura com os padrões de beleza impostos. “Todos nós percebemos o preconceito. Para tentar fugir desses estereótipos de que a pessoa idosa é incapaz, ultrapassada, feia e desvalorizada, as pessoas procuram mudar a aparência, como se a aparência tivesse o poder de revelar o valor das pessoas”, aponta o pesquisador.


Envelhecimento

De acordo com Soares, o envelhecimento é visto com maus olhos mais em algumas culturas do que em outras: “No Ocidente, o preconceito contra o idoso é mais descarado. Em uma sociedade de consumo, que privilegia os meios de produção, o idoso é alguém que não tem nada a contribuir, é assim que as pessoas pensam. Todo o seu legado e sua contribuição na sociedade por tantos anos, tudo isso é renegado e o idoso passa a ser considerado como um estorvo para a sociedade”.


A fixação pela juventude também contribui para a prática do ageísmo — também chamado de idadismo, etarismo ou preconceito etário —, que consiste na discriminação por conta da idade. Relatório realizado pela Organização Mundial da Saúde indica que o preconceito relacionado ao envelhecimento atrapalha o processo de aceitação da velhice. Além disso, essa mentalidade pode se refletir em atitudes, políticas, leis e instituições, sendo prejudicial para toda a sociedade.


Existem culturas como as dos países do Oriente, que valorizam o idoso como um patrimônio da família e da sociedade. “Infelizmente, com a globalização, os países do Oriente estão experimentando o que se tem convencionado chamar de ocidentalização de valores. A competitividade, a individualidade e os valores de mercado, tão comuns no Ocidente, já passam a fazer parte das novas gerações orientais e isso pode indicar que a mesma desvalorização do idoso, ocorrida no Ocidente, em algum tempo também possa ser experimentada nas culturas orientais”, comenta o pesquisador.


Padrão imposto

A padronização presente nas redes sociais e meios midiáticos também tem influência nessa lógica. Soares diz que “a mídia supervaloriza a juventude e, mesmo diante do fenômeno do envelhecimento acelerado que nós estamos experimentando no Brasil, valores comerciais ditam os nossos comportamentos. Como consequência, os idosos vão sendo colocados para escanteio e a impressão que se tem é que o idoso é improdutivo, alguém que não contribui em uma sociedade tão dinâmica como a nossa”.


O pesquisador indica que um livro escrito por Oscar Wilde, no final do século 19, é uma obra-prima para falar da compulsão pela juventude: “Em O retrato de Dorian Gray, o personagem principal faz um pacto para não envelhecer e passa a vida toda com a mesma aparência de jovem. Claramente, esse fenômeno descrito por Oscar Wilde se repete nos dias de hoje e apresenta contornos patológicos que contaminaram toda a nossa sociedade”.


Soares sugere que a sociedade não sabe valorizar as fases da vida. “A ideia da fonte da juventude e a negação do envelhecimento traduzem uma sociedade que não aprendeu que cada uma das fases da vida traz consigo uma experiência de descobertas, desafios e realizações. Isso está sendo perdido por uma geração que investe o seu tempo em idolatrar a juventude e deixa passar sob os seus olhos a beleza do envelhecimento com qualidade. Envelhecer não é prejuízo, quem envelhece tem valor e essa fase da vida também pode ser apreciada pelo idoso e pela sociedade”, destaca.


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