JUN 22, 2022
Flávia Barros - Bem Paraná. Confira matéria original aqui.
Jardinagem está entre as atividades oferecidas na Casa Sol, que também dispõe de acompanhamento psicológico, artes, dança, música e yoga, entre outras (Foto: Frankin de Freitas)
Lá em 2018, a Organização Mundial de Saúde (OMS) estimava que o número de pessoas no mundo, com idade superior a 60 anos, chegaria a 2 bilhões até 2050; estatística que representará um quinto da população mundial. Mas o porcentual já está perto disso, inclusive no Brasil. Segundo pesquisa do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), publicada em outubro do ano passado, dos 210 milhões brasileiros, 37,7 milhões são pessoas idosas, com 60 anos ou mais, ou 17,9% do total.
No mesmo levantamento, outras estatísticas trazem o perfil dos idosos brasileiros: 18,5% do total ainda trabalham; 75% deles contribuem com, pelo menos, metade da renda familiar; 85% deles moram com outras pessoas; 32% têm plano de saúde; e 58% apresentam comorbidades. Para a médica geriatra Uiara Raiana Vargas De Castro Oliveira Ribeiro, especialista em cuidados paliativos e professora da Escola de Medicina da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), o pote de ouro no final do arco-íris, a fonte de juventude, a receita mágica para se ter a velhice “ideal”, é manter-se ativo. “Envelhecimento saudável acontece quando o indivíduo que continua ativo, pode ter alguns problemas, como diabetes, pressão alta, mas se é uma pessoa ativa, que tem autonomia, consideramos que é um envelhecimento saudável. Para isso, depende de duas coisas, do ambiente em que está inserido e da capacidade interior: toda a reserva física e psíquica que acumulamos ao longo da vida (física, sensorial, locomoção, nutricional), por isso que atividade física, alimentação e atividades voltadas à saúde mental são fundamentais e não tem idade limite para iniciar, claro que começar o quanto antes é melhor, mas nunca é tarde”, disse ela, em entrevista ao Bem Paraná. A especialista também ressaltou que não basta mexer apenas o corpo. “Precisamos dar mais importância à saúde mental, porque são fatores que impactam diretamente na saúde da pessoa idosa, a depressão, o isolamento social. Então fazer atividades, não só físicas, mas lúdicas, ter um propósito de vida, são fatores que fortalecem o envelhecimento saudável”, afirmou.
Tudo em um lugar Pensando em oferecer atividades para manter a saúde física e mental em dia, com artes, música, atividades físicas, yoga, psicologia, jardinagem, massoterapia, reiki, dança, entre outras, Curitiba ganhou um espaço que oferece esse atendimento multidisciplinar, exclusivo para idosos, em plena pandemia. Incrustada em uma rua arborizada do São Francisco, na região central da capital paranaense, a Casa Sol completou um ano de funcionamento em maio. A terapeuta e idealizadora do projeto, Isabella Simão, explicou como transformou o imóvel, também cheio de história, construído há 70 anos. “Era um projeto que eu já estava desenvolvendo antes da pandemia, e com a pandemia vi que realmente era muito necessário um espaço em que o olhar para o idoso fosse de uma outra forma, porque quando se fala em saúde para essa população, fala-se muito mais em tratar as doenças, em manter o isolamento para prevenir doenças, o que foi importante num primeiro momento, antes da vacinação, mas com os cuidados e a imunização, a nossa proposta é com esse olhar voltado para a troca, para a socialização, a saúde integral, envolvendo o emocional, que percebemos ser um aspecto que ficou muito prejudicado com o isolamento”, explicou.
Isabella, que também é graduanda em gerontologia, falou sobre como as atividades são ofertadas ao público. “São uma ou duas vezes por semana, com diferentes cargas horárias, adaptadas a cada uma. Fazemos aulas gratuitas de demonstração para que os idosos se identifiquem com o que mais gostam. A gente tem que respeitar a vivência de cada um. A velhice é tão temida pela sociedade, mas a gente busca envelhecer, se a gente não buscasse isso a gente nem se cuidava, e quando a velhice chega, muitas vezes, a gente se vê sem saber o que fazer. A sociedade ainda está aprendendo a envelhecer, a receber e acolher esse idoso. O que fazer com o tempo livre, a disponibilidade, a independência financeira. Temos muitos relatos de que não sabiam que gostavam ou que eram capazes de fazer algo, é o descobrir coisas e ressignificar outras”, finalizou. (Re)descobertas Foi na Casa Sol que o Bem Paraná encontrou a aposentada Ivana Kanasiro, 63 anos, que chegava para sua aula de atividades físicas. Ela é uma das primeiras alunas do espaço e faz o fortalecimento físico duas vezes por semana. Mãe de duas filhas, Ivana contou que sempre se dedicou à família, até se aposentar em 2020. Relatou também que fazia alguns cursos esporádicos, mas o desânimo veio quando passou por um problema de saúde. “A minha filha mais nova praticamente me trouxe pelo braço. Quando eu cheguei aqui estava toda caída, não queria nem vir, no primeiro dia queria ir embora. Mas depois mudou tudo para mim, tudo em minha vida, tanto que eu falo que aqui é a minha segunda casa. Venho e volto caminhando, adquiri mais força e resistência. Não me importo se tem chuva, calor ou frio, me deu muito mais disposição e eu nunca falto”, contou com o entusiasmo vencendo a timidez, do início da conversa.
No quintal do casarão, área onde são feitas as aulas de jardinagem, estava outra aluna. Maria da Graça, 64 anos. Ela se aposentou depois de 40 anos trabalhando na área de pesquisa, museus e documentação em bibliotecas. “Eu dizia que nunca iria conseguir fazer algo com artes, porque me achava desajeitada, mas comecei a fazer as aulas de artes e montei até um ateliê em casa depois disso. Também faço dança, jardinagem e muitas amizades. Eu sempre me dizia que depois de me aposentar todos os dias iria fazer algo por mim, nem que fosse um banho mais demorado, me arrumar, fazer minhas unhas sem pressa, uma ginástica. Aqui eu aprendi a virar a chave, a buscar esse equilíbrio. Quando a gente trabalha não tem esse tempo e quando se aposenta tem o tempo, mas muitas vezes não sabe o que fazer com ele, se eu tivesse que ficar só em casa iria enlouquecer, com as atividades eu consigo esse equilíbrio”, disse com uma planta nas mãos, após aprender mais uma técnica. Momento de troca Com menos da metade da idade das alunas, a professora de jardinagem Elaine Costa, 29 anos, falou, emocionada, do que o trabalho com idosos representa. “Eu sempre falo que eu venho mais para aprender do que para ensinar, porque aqui é uma troca. O que eu percebo é que sempre tem uma evolução, temos alunas que apresentam problemas de cognição ou físico, e elas sempre chegam de um jeito e saem de outro. Passam a lembrar de aulas anteriores, muitas vezes o que parece pequeno, mas é um impacto muito significativo para a qualidade de vida delas. Uma atividade, uma ocupação por si, porque noto que elas sempre faziam pelos outros, pelo trabalho, pelos filhos, pelo marido e eu fico muito feliz de participar desse momento de evolução delas”, contou.
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