MAI 27, 2022
Alex Bessas - O Tempo. Confira matéria original aqui.
Especialistas dão conselhos para os cinquentões que querem cuidar da própria saúde sexual — Foto: Istock
“Sabemos que, com o tempo, o corpo do homem vai se modificando. Quando chega aos 50 anos, além dos cabelos brancos e das rugas, uma dessas modificações diz respeito à redução de níveis de alguns hormônios no organismo, especialmente a testosterona – um andrógeno que atua diretamente em diversas ações do corpo masculino, tais como testículos e próstata, crescimento de pelos e aprofundamento da voz. E esse fenômeno pode interferir na qualidade da vida sexual masculina”, informa o urologista Ricardo Pádua, preceptor da Santa Casa BH e do Hospital São Lucas.
O profissional explica que o acontecimento, popularmente chamado “andropausa”, não pode ser comparado ao climatério, como é chamada a transição fisiológica do período reprodutivo para o não reprodutivo na mulher, culminando na menopausa, a última menstruação espontânea. No caso dos homens, o que ocorre é uma diminuição gradual, mas não total, da produção de testosterona entre os 50 e os 60 anos. Em alguns, essa diminuição pode ser mais forte, gerando alguns sintomas, como a dificuldade para manter ou para ter ereções ou a baixa do desejo sexual.
“Embora as sensações relacionadas ao prazer e à sexualidade não mudem, a parte funcional pode ficar comprometida. Por exemplo, os problemas de ereção – devido ao menor fluxo sanguíneo nos tecidos esponjosos do pênis –, a ejaculação precoce e menores contrações musculares que ocorrem durante o orgasmo também podem ser comuns com o avanço da idade”, informa o médico-cirurgião urologista Leonardo Ortigara em um artigo sobre cuidados com a saúde do homem depois dos 50 anos. Além disso, a andropausa implica outras consequências diversas. Isso porque a diminuição da testosterona faz com que os níveis de estrogênio – um endógeno que, em níveis baixos, também é encontrado nos homens – prevaleçam no organismo masculino, deixando o sujeito mais suscetível a desenvolver problemas cardiovasculares ou a formar coágulos na corrente sanguínea. Contudo, uma redução mais drástica na produção do hormônio é verificada em um percentual pequeno de homens. E mesmo nesse caso é possível tratar o problema com a reposição da substância por meio de injeção, pomada ou pílula. O acompanhamento de especialistas é essencial nesses casos, uma vez que o procedimento pode gerar efeitos adversos. O tratamento é mais complicado, por exemplo, no caso de pacientes com condições como apneia do sono, câncer de próstata, insuficiência cardíaca ou epilepsia.
Portanto, mesmo reconhecendo que a queda da produção hormonal interfira na vida sexual dos cinquentões, Ricardo Pádua é enfático ao lembrar que a principal causa por trás das queixas sexuais a partir dessa idade tem relação com os hábitos de vida ruins desses homens. “Os homens precisam entender que a qualidade de vida como um todo vai repercutir diretamente na capacidade deles de se manterem sexualmente ativos”, informa. “Então é importante manter uma boa dieta alimentar, realizar atividades físicas regularmente, ter boas noites de sono e fazer consultas periódicas, estando atento ao controle de possíveis condições pré-diagnosticadas”, diz. Também é fundamental cuidar do aspecto afetivo e social. “Buscar construir um ambiente familiar tranquilo ajuda muito, e é crucial a boa relação com suas parcerias, dialogando sempre sobre a relação”, aconselha Pádua.
Estratégias. Os apontamentos da médica Maria do Céu Santo, especializada em medicina sexual, estão alinhados às ponderações do urologista Ricardo Pádua. Em uma publicação da revista portuguesa “Prevenir”, que aborda fundamentalmente temas relacionados à saúde, ela adverte que, se não houver disfunção, não há razão para não haver o enrijecimento, mesmo com a diminuição da testosterona.
“Pode é demorar mais tempo a surgir e ser mais difícil de manter. Por isso, alguns homens precisam de mais estímulo”, observa. Maria do Céu aponta que, nesses casos, algumas técnicas simples podem auxiliar na manutenção da rigidez do membro, como exercer pressão, com as mãos ou com uso de acessórios como anéis penianos, em volta da base do órgão. A estratégia funciona por manter o fluxo sanguíneo naquela região. A especialista em envelhecimento e sexualidade lembra que alguns medicamentos, como os antidepressivos e os anti-hipertensores, podem ter efeitos negativos sobre o apetite sexual dos homens. Quando isso ocorre, ela aconselha que os remédios receitados não sejam simplesmente descartados, mas que seja buscada a orientação médica de modo a se verificar a possibilidade de substituição do fármaco.
Tabu Uma das principais dificuldades em relação ao cuidado da saúde sexual masculina após os 50 anos é a pouca disposição desse público em falar sobre os problemas que estão enfrentando. “O tema não é comum na rotina de atendimentos clínicos, sendo, geralmente, evitado”, observa Marco Túlio Cintra, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia. “Quando tocam no assunto, isso ocorre no final da consulta. Dizem: ‘Doutor, tem mais uma coisinha…’, mas raramente vão direto ao ponto. É até difícil saber qual a dificuldade enfrentada para então se fazer o encaminhamento correto”, observa.
O geriatra acredita que tantos pudores em se falar da temática sexual é potencializada por uma questão geracional. “Estamos falando de um grupo que, em geral, não está habituado a falar abertamente sobre sexualidade”, diz, detalhando que, se o paciente tiver relações não heterossexuais, o silenciamento é ainda maior. “Nesses casos, há uma sobreposição de tabus, e o tópico normalmente só vem à tona por iniciativa do médico”, situa. Outro componente que reforça esse comportamento é o etarismo – ou seja, o preconceito baseado em estereótipos de idade. “Existe uma ideia enraizada na nossa cultura de que o sexo é só para os jovens, de que, a partir de certa idade, as pessoas não transam mais. E isso faz que esses indivíduos evitem o assunto, como se não pudessem falar sobre aquilo, como se estivessem falando de algo que não é para eles”, sinaliza.
Por fim, é preciso considerar ainda a falsa sensação de que problemas sexuais poderiam ser solucionados com o uso de medicamentos indutores do enrijecimento peniano. “A dificuldade de ereção pode ser um alerta do organismo para questões vasculares”, alerta, lembrando que a automedicação vai mascarar esses outros possíveis distúrbios, que poderiam ser tratados preventivamente.
Consequências. O silenciamento sobre questões sexuais após os 50 traz diversas consequências. Cintra enumera, por exemplo, os riscos relativos à automedicação e a insatisfação sexual, que pode levar ao comprometimento de relações afetivas e prejudicar a autoestima. Ele também cita que tanto tabu contribui para a disseminação de Infecções Sexualmente Transmissíveis (ISTs). “Este é um grupo que costuma se descuidar mais, dispensando o uso de preservativos. Isso acontece por várias razões, como uma menor preocupação com o risco de gravidez. Além disso, as campanhas de conscientização são raramente pensadas para esse público”, critica.
Masculino adoecido Recentemente, o especialista em gerontologia Ney Messias Jr., que atua como ativista do envelhecimento ativo, propôs falar sobre a vida sexual masculina após os 50 anos em suas redes sociais. Como resultado, ouviu diversos relatos femininos. “Mas os homens pouco falam sobre o assunto, apesar de esta ser uma demanda de suas parcerias, que desejam, sim, que eles se abram mais”, diz, confirmando os apontamentos de Marco Túlio Cintra. “Esse silenciamento faz que nós estejamos envelhecendo pior do que elas. Tanto que temos hoje uma velhice feminilizada, pois as mulheres têm expectativa de vida superior”, pontua. A regra, segundo ele, também se aplica à vida sexual. Para ele, a solução desse problema passa para uma revisão da masculinidade – mas poucos estão dispostos a encarar essa questão.
“Falando de sexo, por exemplo, precisamos lembrar que a sexualidade masculina é muito falocêntrica. Mas o sexo não é só falo, não é só penetração. O verdadeiro sexo acontece na troca de intimidades, de vulnerabilidades. Se isso não é compreendido, quando o falo falha, o sexo se torna inviável”, diz, sublinhando que o fracasso na cama repercute em diversos outros aspectos da vida, sendo, inclusive, um fator para o sofrimento mental.
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