Envelhecer? Temos de pensar nisto enquanto é tempo
- koala hub
- 16 de jul. de 2022
- 4 min de leitura
JUN 08, 2022
André Rito e Sara Tarita - Expresso. Confira matéria original aqui.
Fator fundamental na nossa vida, o envelhecimento saudável e ativo passa, entre outras coisas, pela literacia digital e financeira. Que projetos existem em Portugal? Quem está no terreno? A Rede Repensa e o gabinete criado pelo Governo da Madeira são alguns exemplos de como se prepara o futuro pensando na longevidade

Quando é que devemos começar a preparar a velhice? As rugas não aparecem de um dia para o outro, não somos novos e saudáveis e acordamos no dia seguinte velhos e doentes. Mas há uma certeza biológica: somos vulneráveis ao tempo. Quanto mais tempo vivemos, menos somos capazes, física e psicologicamente. É por isto que Elísio Costa, professor da Faculdade de Farmácia do Porto, e coordenador da Porto4Aging, defende que o envelhecimento deve ser preparado desde cedo. “Não é quando somos velhos. Deve ser visto como um processo, acompanhado por ações feitas ao longo do ciclo de vida.”
Mas de que forma? Na Porto4Aging - consórcio que reúne mais de 90 organizações, envolvendo decisores, prestadores de cuidados, empresas e universidades - procuram-se respostas e desenvolvem-se ações. “Temos diferentes projetos, muito relacionados com saúde digital. Soluções que permitam que as pessoas vivam de forma cada vez mais independente. Os nossos seniores querem viver mais, com mais qualidade e autonomia”, diz ao Expresso o professor, acrescentando estas iniciativas e políticas têm como foco o “ciclo da vida”, que deverá ser “pensado desde cedo”.
Também Nuno Marques, do Observatório Nacional para o Envelhecimento, concorda que a sociedade encara o envelhecimento “de uma forma negativa”. “Olhamos para a carga dos últimos anos de vida com um enorme peso, mas a verdade é que o envelhecimento acontece durante toda a vida.” Daí a importância de nos prepararmos para o inevitável: começamos a envelhecer quando nascemos, num processo evolutivo que culmina com a nossa morte. “Temos de regressar, ir atrás, temos um grande fosso entre os anos vividos com saúde e os de maior dependência física. Para melhorar a qualidade de vida do último terço é preciso pôr em prática medidas que cheguem à população que está neste momento no ativo.”
Integrada na Rede Repensa – Rede Portuguesa de Envelhecimento Saudável e Ativo -, a Porto4Aging juntou crianças e adolescentes com idosos, numa lógica de partilha de experiências. A ideia, implementada em 2017, era colocar os mais jovens a ensinar seniores a trabalhar com meios informáticos e digitais. Desenvolvida durante vários dias, juntou numa sala de aula alunos do Colégio Luso-Internacional do Porto com utentes do Centro de Apoio Social do Porto – Instituto de Ação Social das Forças Armadas. Objetivo: testar a eficácia da abordagem intergeracional no ensino de adultos.
José Manuel silva, fundador da Caregivers Portugal e presidente da Escola Superior Saúde Santa Maria, é um defensor deste tipo de estratégias relacionadas com a perda de autonomia da pessoa. “Temos vindo a desenvolver ações no âmbito do envelhecimento ativo”, refere. Exemplo disso foi o “VintAging + felizes”, cujos objetivos passaram por “promover a integração social, combater a pobreza e discriminação, assim como a promoção do empreendedorismo social e da integração profissional”. Trata-se de um dos principais fatores no envelhecimento: o fim do trabalho, com todas as consequências cognitivas, físicas e financeiras que acarreta.
Mas, se o envelhecimento é uma realidade em Portugal – quarto país mais envelhecido da Europa -, a verdade é que os especialistas em demografia defendem que existe uma oportunidade quando se fala da economia grisalha. Ana Sepúlveda, da Age Friendly Portugal, surgida nos finais de final de 2019, diz que esta associação é precisamente “fruto da necessidade de juntar um grupo de empresas que estavam sensíveis para o tema”. A ideia, continua, é desenvolver negócios entre estas empresas portuguesas e outras estrangeiras. “Somos uma associação empresarial sem fins lucrativos, para fazer a ponte entre Portugal e países interessantes na economia da longevidade”, afirma. Atualmente, a associação conseguiu realizar 14 parcerias. “Devemos ter uma estratégia que permita reforçar áreas importantes da economia com países que estão desenvolvimento em nesta área. A associação é um catalisador da transformação.” ENVELHECIMENTO ATIVO A ideia é consensual: “É uma oportunidade, a silver economy é uma realidade que se cruza com diferentes atividades, como o turismo, cuidados de saúde, beleza, habitação, consumo. Tudo isto pode ter impactos muito positivos gerados pelo aumento da longevidade”, diz Edmundo Martinho, provedor da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (SCML). “É preciso incorporar saberes para promover a proximidade intergeracional. Só assim podemos trabalhar melhor e sermos melhores membros da comunidade.”
As misericórdias e o sector social desempenham um papel fundamental na longevidade. Outras associações, como a Rede Repensa ou Age Friendly Portugal, estão também no terreno para tornar Portugal num local de excelência para a inovação e o envelhecimento saudável e ativo. Os projetos estão espalhados por praticamente todo o país e ilhas, inspirados em modelos internacionais que outras nações têm vindo a implementar. Porto, Coimbra, Lisboa e Algarve (Porto4Ageing, Ageing@Coimbra, Lisbon-AHA, Algarve Active Ageing) são apenas alguns dos centros de referência no ativo em Portugal.
No Funchal, por exemplo, foi criado uma Direção Regional para as Políticas Públicas Integradas e Longevidade, liderado pela ex-adjunta do Gabinete do Vice-Presidente do Governo Regional. Com a função de estabelecer ligação entre os mais idosos e o sistema de segurança social, sociedade civil e instituições do sector social, o gabinete já tem algumas parcerias estabelecidas com instituições locais. O objetivo é criar condições para os idosos que habitam numa das regiões mais envelhecidas de Portugal: estima-se que, em 2080, existirão na Madeira 409 idosos por cada 100 jovens.
Comments