JUL 19, 2021
Maria. Confira matéria original aqui.
Assim que o programa “O Amor Acontece” estreou, Ide e Jorge, 64 e 75 anos, respetivamente, deram logo que falar. Os dois mostraram-se amorosos, descomplicados e sem preconceitos no amor. E até no sexo ela transmitiu uma mensagem de vontade de desfrutar o prazer.
A Maria falou com Rita Castro, especialista em sexologia e terapia de casal, sobre um tema que afinal ainda suscita muitas questões: o sexo na terceira idade.
Ainda há tabus quando se fala na sexualidade em casais mais velhos?
Há tabus na sexualidade, mais ainda na sexualidade de casais mais velhos. A tendência geral é chegada a velhice não se falar do assunto, como se a sexualidade acabasse com a mesma. Não é assim. A sexualidade acompanha-nos até à morte, com adaptações, mas pode ter-se tanta satisfação na velhice como antes. E a saúde sexual é fundamental ao bem-estar e satisfação na vida.
Porém, socialmente, ainda há muito tabu. Por um lado, desconsideração da necessidade sexual: “já não tem idade para isso”, “já não tem interesse”. Por outro, desaprovação da vivência sexual: “já tem idade para ter juízo”, “isso é lá coisa que se faça com esta idade”. As próprias pessoas sentem vergonha (também da educação que tiveram) de falar e sobretudo expressar as dificuldades e pedir ajuda e informação, resignando-se à perda e declínio desta área na vida.
Quem reclama mais por sexo nesta fase de vida: homens ou mulheres?
A vivência do sexo nesta fase tende a ser reflexo daquilo que foram as experiências anteriores na vida adulta, condicionadas pela educação que se teve. Talvez sejam mais os homens a pedir sexo, pelas ideias desta área ser importante para o sentido de virilidade e masculinidade. Para muitas mulheres, ensinadas a retrair e não expressar o prazer, submissas à vontade do homem, a velhice e até a menopausa, com o fim da vida reprodutiva, podem ser o fechar de uma “tarefa” que não era boa, da qual não se retirava prazer, por isso não pedirem.
O que muda no sexo depois dos 60?
As maiores mudanças nem estão tanto nas alterações físicas (da idade, situações de doença e/ou medicação), que não impedem ou incapacitam ou criam desinteresse só por si pelo sexo. O que muda está mais na forma como se encara o sexo depois dos 60. Às vezes, pensa-se que “isto já não é para nós”, é “coisa de jovens” e que já não se tem idade para “essas coisas”, então, desinveste-se e torna-se inexistente.
Às vezes, com mais liberdade, menos responsabilidades e mais tempo livre, dá-se maior importância às carícias, ao toque, ao afeto. Como um redescobrir do sexo, sem tantas preocupações com o corpo, o desempenho sexual, e mais focado no toque e no prazer.
Os homens, devido à ideia de que o sexo requer um pénis viril, rijo, como com as alterações da velhice a resposta erétil muda, têm medo de falhar na relação sexual e podem evitar e afastar-se do sexo. Mas não tem de ser assim, existem formas de melhorar a função erétil e o sexo não se resume à potência do pénis. Podem ter-se outras atividades sexuais com prazer. As mulheres, com as alterações hormonais da menopausa e velhice, tendem a ter menos interesse pelo sexo e a atrofia e secura na vulva e vagina podem fazer aparecer dor genital, que juntamente com a vergonha do corpo envelhecido levam-nas a afastar-se do sexo. Mas também aqui há forma de melhorar estas queixas e manter-se sexo com satisfação.
O que exige a mulher no homem nesta fase de vida em termos de intimidade?
É algo muito individual. Mas, tendencialmente, as mulheres, como a Ide, centram-se sobretudo na necessidade de contacto, aconchego, compreensão e satisfação na relação. É a satisfação relacional, com mais intimidade afetiva, emocional, que procuram.
Uma vez que a ereção no homem poderá já estar condicionada, como pode alguém após os 60 dar prazer a uma mulher?
Esta ideia de que o sexo é penetração e tem de existir para haver prazer é mito. O prazer da mulher está sobretudo fora da vagina, por isso um homem de qualquer idade, com ou sem ereção, pode dar-lhe muito prazer. Prazer que pode chegar através do toque, centrado no estímulo com as mãos no clitóris e lábios ou seios, mas também pode ser o toque pelo corpo com massagens sensuais.
Que preliminares devem ser feitos para que o casal atinja o orgasmos?
O orgasmo não deve ser a meta, mas uma possibilidade sexual. É muito importante estimular o nosso órgão sexual mais poderoso, o cérebro, com fantasias sexuais, pensar em coisas que excitem, realizar atividades que façam sentir bem, rir junto. E estimular o maior órgão sexual, a pele, com massagens, beijos, carícias. O toque e o beijo são muito importantes para despertar o erotismo e desejo sexual. Depois, a masturbação mútua (com lubrificante, para mais conforto), estimular com os dedos e mão o pénis e/ou a vulva e vagina, e as práticas de sexo oral podem criar muita excitação e facilitar o prazer para chegar ao orgasmo.
É o orgasmo uma condição no sexo destes casais?
Depende das pessoas e dos casais. O orgasmo não tem de ser uma condição para que o sexo seja bom, mas pode continuar a ter-se orgasmo e ser algo a investir se der prazer e for importante. Acho que vale a pena lembrar que o mais importante é ter prazer. Nos casais mais velhos, o orgasmo, orgasmos múltiplos e em simultâneo, já não tem a mesma importância de antes. O foco está mais no prazer, no momento, no saber bem, naquele carinho e afeto, e não tanto no desempenho, no orgasmo.
Como podem os casais ultrapassar alguns preconceitos nesta idades?
Os preconceitos são os maiores inimigos. Inspirem-se na Ide e no Jorge. Saber que estão sempre a tempo e que o sexo e a sexualidade fazem parte da vida até ao fim. O sexo aproxima o casal e ajuda a uma velhice com mais saúde. Não terem vergonha de falar e pedir ajuda se sentem alguma alteração no sexo que incomoda. Também saber que sexo não é só penetração, que há muito mais. É importante que haja informação, nos centros de saúde, centros de dia, lares, universidades para seniores, media, e ter preocupação em saber acerca desta área da vida, nas consultas, exames, lares.
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